quarta-feira, 20 de abril de 2011

ÚNICA DO MUNDO

Até mesmo um escritor nostálgico (que já foi chamado de Maldito por ele mesmo...) sofre seus vazios às vezes... poucas coisas são tão dolorosas como um parto, e isso pelo menos eu nunca vou entender o quanto, pois em sua perfeição, Deus me privou dessa responsabilidade. Mas escrever esse post foi, e está sendo tortuoso, porque diversas vezes ele foi iniciado e apagado... como se de repente me faltassem as palavras para escrever, e eis uma sensação à qual eu não estou acostumado. A verdade é que ainda que eu acredite que possa exprimir com minhas palavras o que eu bem entender, existem coisas dentro de mim que me colocam num impasse, por incapacidade, limitação humana, ou mesmo a limitação do próprio gênero crônica, lamentavelmente considerado menor dentro das classes literárias.
Geralmente dedico umas duas ou três horas para escrever minhas crônicas. Eu faço um esboço, escrevo tudo o que eu quero, sem me preocupar com correções, gramatiquices e bobagens do tipo. Meu discurso é Livre e Direto. Feito o texto, leio uma vez. Se ficou bom, não altero nada. Se for muito tarde da noite, deixo para publicá-lo no dia seguinte. Então, na hora de publicar, leio de novo. Aí começo a fazer algumas correções... elimino redundâncias, acerto concordâncias, coisas do tipo. Então publico. Aí leio de novo, porque depois de publicado é sempre possível achar alguma coisa errada. Então quando eu acho, tiro o post do ar, e edito de novo. Simples assim.
Mas essa crônica tem me custado muito mais do que qualquer outra que eu tenha escrito anteriormente, porque quando me sentei em frente ao computador eu tinha mil assuntos para expor, e caramba... eis que eu abro um Novo Documento do Word e tudo o que eu consigo ver na minha frente é uma tela em branco. O que antes era uma promessa de repente tornou-se um vazio assustador...
Eu senti como se houvessem colocado um espelho diante da minha alma...
Porque diante de tantos acontecimentos polêmicos que giram ao redor do mundo, de repente eu caí em mim sentindo que estou cansado de dar murros em ponta de faca. Simplesmente senti que não tenho forças pra me posicionar contra ou a favor do que quer que seja, preciso nesse exato momento da minha vida fazer uma pausa de espírito e cuidar de mim... Pois é bem verdade que morar sozinho traz vantagens extraordinárias, quando se trabalha e é dono do próprio nariz, mas a solidão tem seu preço, e mesmo um sujeito introspectivo como eu muitas vezes sou testado ao extremo da tolerância. Se por um lado tenho meu lar como um refúgio, um lugar onde sempre posso embalsamar minha alma e me preparar para o próximo desafio, por outro, existem ocasiões em que dizer tchau para um amigo ou colega de trabalho ao final do expediente ou da aula traz um sentimento terrível, pois sei que as cordas vocais que vibraram às seis ou sete da noite muito provavelmente só voltarão a ser usadas no dia seguinte as oito da manhã, cerca de doze horas depois.
Felizmente, a vida moderna permite que algumas janelas para o mundo sejam abertas ainda que a gente nem precise sair de casa. Escrever em um blog é uma experiência libertadora, mas não substitui o convívio pessoal, e eu considero lastimável ver que muitas pessoas acham que, se podem “ver” seus amigos todos os dias no MSN, por exemplo, então estão entrando em contato. Não percebem que no fundo não estão interagindo com ninguém de fato, apenas com uma máquina animada que reproduz o que seu amigo está digitando do outro lado do teclado.
O contato pessoal te obriga a olhar os olhos do outro, faz suas mãos tremerem, faz a gente se preocupar com a aparência, com o cheiro... até com a saúde... A gente consegue ouvir a risada do outro, o ronco da barriga, descobre para onde ele olha quando está distraído, o que diz quando bebe algumas, vê as marcas que tem no rosto, como cuida das unhas, do cabelo... se está feliz ou triste, se ainda acredita na vida ou se apenas espera algum milagre acontecer...
A experiência da solidão tem me feito uma pessoa mais sensível a algumas coisas que passam despercebidas àquelas que sempre tiveram com quem contar. Eu procuro valorizar pequenos gestos, como um aperto de mão bem forte, um toque nos cabelos, ou um beijo no rosto, porque preciso sentir as pessoas que estão ao meu redor, e preciso ser presente. Uma mensagem pelo celular, um telefonema, um e-mail ou mesmo um scrap que não tenha sido enviado para mim e para mais 387 amigos... são coisas pequenas que podem fazer toda a diferença no dia de quem passou 24 horas esperando por nada (e só recebeu sms da operadora...)
Minha filhinha sabe que todas as vezes em que conversamos, ao nos despedirmos eu devo dizer “te amo muito, mais que tudo”, ao que ela responde da mesma forma. E ainda desenha no ar um coração, beija as mãos e sopra pra mim dizendo: “um coração pra você”. Porque eu quero ensiná-la desde criança que bonito mesmo é dizer o que se sente, é expressar quando se gosta de alguém, e não ficar se escondendo atrás de máscaras de indiferença e aspereza. Aprendemos e reforçamos, principalmente na adolescência e juventude, que estar apaixonado é motivo de vergonha, e deve ser escondido, quando feio mesmo deveria ser a atitude de quem não gosta, não se apaixona, porque a paixão nos faz sentir vivos, plenos, pois (putz, vai soar meio clichê) só quem ama consegue viver intensamente. Ainda que se sofra por amor, mesmo que a princípio isso pareça uma alienação, mas vale mais sofrer por uma paixão do que o sofrimento de nunca ter se apaixonado.
Certas coisas a gente só dá valor quando se perde. Perdi muitas coisas na vida, algumas pra sempre, outras não. Lembro-me de uma pessoa muito querida, que conheci há muitos anos, num retiro de grupo de jovens em Areias, que participei quando tinha entre dezoito e dezenove anos. O apelido dela era Ri, ela tinha um nome diferente e se auto-intitulava Ri, Única do Mundo. Tornamo-nos grandes amigos naquela época, a internet ainda não era uma realidade como hoje e trocávamos cartas feitas à mão mesmo. Nós ficamos algumas vezes, mas o que era mais importante pra gente era nossa amizade, nossa cumplicidade e companheirismo. Ela gostava das mesmas coisas que eu, queria estudar Química (eu já fazia o curso técnico) e simplesmente vibrava com minhas conquistas, e eu com as dela.
Depois passamos algum tempo sem nos ver, os anos se passaram e eu me casei, a vida tomou outros rumos, quando encontro a Ri de novo em 2003, num ponto de ônibus próximo à UFMG. Estava casado havia apenas um ano, contamos as novidades, trocamos e-mails (aaah, agora sim!) e prometemos manter contato a partir de então. O importante era saber que estávamos bem, e sempre seríamos amigos.
Eu não mandei os e-mails a princípio, mas com o passar dos anos me veio a saudade daquela pessoa que sempre me apoiava em tudo, e então comecei a enviar mensagens para saber das novidades, como ela estava, se tinha conseguido entrar para o curso de Engenharia de Minas que era seu sonho, enfim... por onde ela andava. Mas ela não respondia nenhum dos meus e-mails.
Pensei que ela pudesse ter mudado o endereço ou coisa assim. Eu pelo menos esperava por isso, pois com todas as promessas que já havíamos feito um pro outro de sempre manter viva nossa amizade, achava um absurdo que ela se recusasse a me responder daquela forma ou mesmo não me procurasse, ainda que estivesse namorando alguém, ou casada. Mas então finalmente tive uma idéia de como achá-la. O título de Única do Mundo não era por acaso. Ela já tinha feito uma pesquisa em todos os sites de busca conhecidos por alguém que tivesse o mesmo nome que ela (sim, o Google já existia) e jamais encontrou uma só homônima. Lembrei-me dessa história e sabia que, se digitasse o nome dela no Google, as únicas ocorrências seriam para ela mesma, e eu poderia ter alguma pista de onde minha amiga andava, que não me dava notícias.
E foi assim em 2009 que descobri que, desde o ano em que eu a vira pela última vez, minha amiga está morta, vítima de um aneurisma cerebral. E agora, com inesperadas lágrimas que me saem dos olhos, tudo o que posso afirmar é que a Ri nunca me desapontou, porque eu entendi que só mesmo um motivo muito forte poderia tê-la forçado a não responder uma mensagem minha, ou mesmo ter se ausentado por tanto tempo. Sou grato por ela ter partido sabendo o quanto era importante na minha vida e Ri... onde quer que esteja, peço que perdoe por ter demorado tanto tempo para perceber que você só não estava mais comigo porque não estava mais conosco...
Então aprendi que cada vez que deixo de dizer “eu te amo”, corro o risco de ter perdido a última chance, a derradeira chance, de fazer com que quem eu amo saiba de fato que é amado. A distância entre o que foi e o que nunca mais será é muitíssimo pequena, entretanto, o que nunca será e o que poderia ter sido é infinita. Não há vergonha em ser intenso, se isso implica em ser honesto com os próprios sentimentos. Engraçado como a gente gosta de ouvir, mas tem vergonha de dizer. E de não em não, vamos passando pela vida, fechados em nós mesmos, até que o irônico destino se encarregue de tirar de cena os únicos do mundo pelos quais descobrimos tarde demais que esperaram a vida inteira por um simples gesto nosso.
Abraço a todos e até meu próximo post.
Gustavo Jonathan Costa
Porque a vida vale a pena HOJE.

6 comentários:

  1. Nossa. Me emocionei. Que triste. Realmente muitas vezes na vida me arrependi por não dizer o que sentia. Perdi meu pai quando era muito nova, tinha apenas 12 anos. Até hj me arrependo por não ter tido a maturidade de saber que dizer que eu o amava muito não era motivo de vergonha. Meu lado egocêntrico próprios da idade não me deixou expressar da forma que ele merecia, o quanto ele foi importante e o quanto eu o amava.
    Valeu amigo!
    Amei o post.

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  2. What da hell?????
    Credo, véi! Não tem uma postagem sua à qual eu seja inerte. Não dá pra não sentir nada! Não consigo descrever o que sinto; é uma sensação estranha qdo leio seus escritos. É mais que apreciação, admiração... Sei lá! Só sei que curto bastante, muito mesmo! :D

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  3. Olá querido amigo.
    Li isso como comentário num outro blog e achei adequado transcrever aqui.
    Um bjo grd. Julia.

    DAR NÃO É FAZER AMOR

    Dar é dar.
    Fazer amor é lindo, é sublime, é encantador, é esplêndido.
    Mas dar é bom pra cacete.
    Dar é aquela coisa que alguém te puxa os cabelos da nuca…
    Te chama de nomes que eu não escreveria…
    Não te vira com delicadeza…
    Não sente vergonha de ritmos animais. Dar é bom.
    Melhor do que dar, só dar por dar.
    Dar sem querer casar….
    Sem querer apresentar pra mãe…
    Sem querer dar o primeiro abraço no Ano Novo.
    Dar porque o cara te esquenta a coluna vertebral…
    Te amolece o gingado….
    Te molha o instinto.
    Dar porque a vida é estressante e dar relaxa.
    Dar porque se você não der para ele hoje, vai dar amanhã, ou depois de amanhã.
    Tem pessoas que você vai acabar dando, não tem jeito.
    Dar sem esperar ouvir promessas, sem esperar ouvir carinhos, sem esperar ouvir futuro.
    Dar é bom, na hora.
    Durante um mês.
    Para os mais desavisados, talvez anos.

    Mas dar é dar demais e ficar vazio.
    Dar é não ganhar.
    É não ganhar um eu te amo baixinho perdido no meio do escuro.
    É não ganhar uma mão no ombro quando o caos da cidade parece querer te abduzir.
    É não ter alguém pra querer casar, para apresentar pra mãe, pra dar o primeiro abraço de Ano Novo e pra falar: “Que que cê acha amor?”.
    É não ter companhia garantida para viajar.
    É não ter para quem ligar quando recebe uma boa notícia.
    Dar é não querer dormir encaixadinho…
    É não ter alguém para ouvir seus dengos…
    Mas dar é inevitável, dê mesmo, dê sempre, dê muito.

    Mas dê mais ainda, muito mais do que qualquer coisa, uma chance ao amor.
    Esse sim é o maior tesão.
    Esse sim relaxa, cura o mau humor, ameniza todas as crises e faz você flutuar

    Experimente ser amado…

    Luís Fernando Veríssimo

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  4. Ahh sim, só pra deixar claro. O comentário anterior ñ foi devido ao caso que vc mencionou especificamente neste post, mas acho q se encaixa bem na fase da vida q vc está(va?) vivendo.

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  5. Ei Júlia, excepcional contribuição essa sua para meu blog, adorei a citação do Veríssimo, do qual sou fã.
    A fase que vivo agora é um pouco mais nostálgica, mas ainda assim cheia de tesão... no sentido bíblico da palavra, não estou interessado em dar, mas receberei com muito prazer!!!
    Abraço enorme pra você.

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  6. Gu,seu post me fez lembrar as muitas cartas que eu e Leo trocamos antes de namorar e depois...carta é carinho, uma coisa pessoal! A carta, diferente do e-mail, é endereçada e escrita só pra vc, com algo que alguém quer que vc saiba. É sinal de atenção de dedicação, pois é escrita a próprio punho...podemos senti-la com o tato e o olfato, coisa que o e-mail não permite. Carta permite que cultivemos uma dedicação, uma escrita bem personalizada à alguém. Bom demais receber e enviar cartas!
    Sobre o amor: quão engraçado é não dizer aos nossos pais que os amamamos! São as primeiras e as últimas pessoas a nos amar incondicionalmente!Devemos ter menos vergonha disso! E é muito bom saber desse amor sem esperar que a morte nos cause a angustia de não tê-lo revelado! Como foi bom saber que meu pai morreu sabendo o quanto eu o amava. A cada ligação e a cada despedida era um "eu te amo". E depois que ele se foi, foi muito bom não sentir a angústia que os filhos sentem nos velórios dizendo "te amo, queria que vc soubesse disso aonde estiver" ou "te amo, pena não ter dito antes". Quantas vezes já não vi essa cena! Realmente "é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã"!
    Muito lindo este post...lindo e triste, mto real!
    Abraço, Gu! Parabéns pelo post! Amei!hehe

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