domingo, 10 de abril de 2011

A BOLA DA VEZ

(segunda crônica desse final de semana. Se ainda não leu a primeira, veja logo abaixo)

Por muitas vezes nesse mesmo blog já fiz relatos apaixonados de minha infância e minha juventude. É bem provável que a essa altura, o leitor já acostumado com meus posts consiga compreender um pouco da formação do meu caráter, entende as dificuldades que enfrentei, os conflitos que vivi, o que eu era e o que eu sou e porque eu sou. Ora, muitas vezes já me senti perseguido pelo destino, como se houvesse sido colocado no centro de uma grande piada cósmica, aos serviços de divertir algum Criador cujo senso de humor fosse completamente questionável.

O tempo passou e me dei conta de que não sou lá tão especial assim pra merecer a atenção de quem não tem mais nada pra fazer a não ser assistir pra onde vai essa merda toda que ele criou. De repente, a gente começa a olhar para os lados e vê que no fundo só existe vida miserável e cheia de dificuldades, e que comparada a outras histórias, a gente acaba tendo motivo de sobra pra rir à beça de alegria, e no fundo se sentir até mesmo um pouco privilegiado.

Nunca fiz nada pra merecer enfoque exclusivo. Reconheço minha mediocridade nas minhas feições mestiças, na minha inteligência limitada e até no meu tipo sanguíneo, de longe o mais abundante na face da terra. Se tiver algo especial, é uma verruga na virilha que preciso queimar o quanto antes. Até o ordinário molde do meu rosto só ficou bonito quando usado na minha filha... Fora isso não me destaco por nada exatamente, e foi assim durante toda a minha vida, mesmo naqueles anos em que a aceitação pelos outros era tema central da minha torturada existência social. Durante a adolescência foi difícil aceitar minhas limitações. A religiosidade, o fato de não ser bom nos esportes, as mãos pequenas, estar sempre acima do peso, tudo isso contribuiu para que eu me desenvolvesse com uma personalidade um pouco mais retraída, subjetiva, romântica e ligeiramente depressiva...

Então a gente cresce, vira homem, assume responsabilidades, descobre nossas aptidões, manda o mundo tomar no cu, e segue andando pela selva de pedra em busca de sobrevivência, compartilhando experiências e descobrindo que todos esses medos e incertezas são tão universais quanto umbigo... todo mundo tem, teve e terá. Em muitos casos, torna-se difícil superar certas limitações, e às vezes a ajuda de amigos apenas não é suficiente, precisamos recorrer à ajuda profissional. Psicólogos, psiquiatras e psicanalistas estudam durante anos pra ficar escutando e analisando a condição ruim de gente que não conseguiu superar esse sentimento de frustração e passou a vida inteira se sentindo mais na merda do que todo mundo. Esses deveriam assumir logo suas fraquezas, colocar o rabinho entre as pernas e procurar a ajuda desses profissionais...

Isso o cara deve fazer ANTES de ter uma piração total, pegar uma arma e entrar numa escola para atirar em meninas de dez anos à queima-roupa porque o miserável era desprezado durante a infância. Porque quando o filho da puta começa a achar que sua vida é pior do que a dos outros, é geralmente isso o que acontece. O cara não se trata, se sente sozinho, humilhado, e acha que a culpa disso tudo é do mundo, e não dele que não teve competência suficiente para se socializar adequadamente. E aí quer notoriedade, vai matar os filhos de quem não tem nada a ver com sua existência medíocre e SÓ DEPOIS estoura os próprios miolos. Meu amigo, você leitor que se por algum motivo estiver vivendo drama semelhante, faça um favor para mim e pra toda a humanidade, ESTOURA A SUA CABEÇA AGORA, antes de fazer qualquer besteira. Porque pra todo mundo já é difícil demais lutar todos os dias para sobreviver financeiramente, sustentar os filhos e o governo, agüentar jornalista falando que pobre não pode ter carro e ainda ter que chegar em casa e ver certas notícias na televisão. Todo mundo tem vontade de descarregar tudo num Dia de Fúria, mas é de ficar puto quando a gente vê um retardado fazer isso. Eu já me sentia indignado quando escrevi minha crônica Big Brother 174, e agora parece até que pressentia que outra tragédia como essa ia acontecer, porque no momento em que soube do que houve naquela escola do Rio de Janeiro eu só pude pensar em minha filha de 5 anos sozinha em uma escola... e de novo aquele sentimento de impotência se abateu sobre mim.

Se tem gente tentando entender a cabeça desse desgraçado Wellington, não sou eu. Lamento apenas que ele tenha morrido antes da hora. Não há o que entender, o rapaz se saía bem na escola, era bom nos esportes, e não conseguia se socializar. Se estava enlouquecendo, PROCURASSE AJUDA, não esperasse o mundo conspirar pra salvá-lo, porque ele NÃO FAZ ISSO. A felicidade de cada um de nós está em nossas próprias mãos, ainda que nossa destruição possa estar nas mãos de outros. É assim, é a vida, é cruel mas é a lei do universo, e ela vale pra todo mundo.

Se a cada sentimento de rejeição eu fosse estourar os miolos de alguém, não haveria mundo que chegasse. Mas com o tempo, a gente começa a enxergar as compensações, e vê que o mundo não é tão injusto assim. Eu tenho saúde. Posso comer de tudo e não passo mal. Sei nadar. Tenho pai, mãe, irmãos e filha. Todos eles sabem que os amo porque já ouviram isso da minha boca. Sei também que a recíproca é 100% verdadeira porque já ouvi deles declarações igualmente apaixonadas, quer coisa melhor do que isso?

Antes de enlouquecer, procuro pensar que existem pessoas que contam comigo, e precisam de mim bem e feliz. Essa cambada da família aí vibra e torce pelo meu sucesso. Tenho amigos onde trabalho que precisam que eu execute bem minhas tarefas para que as deles não sejam prejudicadas. Tenho uma filha que acha que eu sou o Super-Homem. Para aquelas pessoas que conheci e vivi por tempo suficiente para fazer a diferença eu preciso tomar uma atitude positiva, vencer minhas barreiras, minhas limitações, e aceitar minhas mediocridades para não mergulhar na insanidade, pois minha vida não pertence só a mim, embora seja de minha total responsabilidade.

Mas hipoteticamente falando, ainda que a consciência de tudo isso me fugisse um dia, ainda que o fardo da minha existência fosse tão grande que eu já não conseguisse suportar, que nenhuma psicanálise ou Rivotril tenha surtido efeito além da eventual brochada, que eu acabe somente comigo mesmo sem pra isso ter que atrapalhar a vida de ninguém que não tenha nada a ver com isso. E fica a dica, meu amigo. Se você tá sozinho, se sentindo desprezado pelo mundo, pare de achar que estão menosprezando você, às vezes é só pelo fato de você ser um babaca mesmo, vai se tratar, ler, estudar, descobrir que existem outros como você, desabafar, ALGUÉM nesse mundo vai querer te ajudar, nem que você tenha que pagar pra isso, procure umas prostitutas, trabalhe, faça exercícios, entre para uma academia de artes marciais pra descarregar a tensão, faça atividades em grupo, TOME UMA ATITUDE...

Ou morra sozinho, o que ainda é muito melhor do que ser lembrado eternamente como um grande filho da puta.

2 comentários:

  1. O Gu é um gênio e, como todo gênio, sua vida pessoal é uma bagunça. Não sei se o Gustavo ficará milionário ou morrerá sem um centavo no bolso, o que sei é que o Gustavo foi o único aluno que conheço que, na 5ª série, ganhou uma caixa de bombom da professora Eliana por fechar a prova de português. Sei também que ele é lembrado no Coltec por alunos e professores como um cara que levava a sério as relações humanas. O cara foi líder de grupo de jovens e inspirou muitos rapazes e moças quando, de maneira apaixonada, dizia o que pensava e os valores que carregava. Sempre esteve entre os melhores alunos em uma escola de uma pequena cidade chamada Pedro Leopoldo, mas também se sentou-se entre os melhores no segundo grau no Colégio Técnico da UFMG e graduou-se na mais conceituada universidade de Minas Gerais.
    O Gustavo é especial, assim como o camarada de Realengo também era especial. Infelizmente em nossa sociedade, as qualidades individuais (nossas particularidades) não são exaltadas e trabalhadas para um bem coletivo. Não quero dizer somente que o Wellington era um coitadinho e pedir para que todos perdoem o “pobre sofredor” do Wellington, mas quero chamar a atenção que, assim como o Wellington, o Gustavo (sabe-se lá DEUS porque) se uniu ao grupo cada vez maior de pessoas que sentiram tristes e deprimidas por serem quem são. Tem algum problema no mundo para que pessoas boas, inteligentes e batalhadoras (como o Gu) se unam em sentimento com pessoas desequilibradas como nosso camarada do RJ.
    Gustavo, ponha-se sempre no seu lugar: um lugar de destaque! E lembre-se (parece que o que vou escrever agora é tirado de um livro de auto-ajuda, mas não é) as cicatrizes que você carrega não devem ser motivo de vergonha pra você. A vida, não sei bem o porquê, resolveu nos presentear dessa forma para cada grande lição aprendida.
    Se um cara como você se sente (ou sentiu) pouco especial, deve ser melhor que um cara como eu repense nos próprios conceitos porque devo estar sendo otimista ao extremo.
    Grande abraço.

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  2. Quem andou influenciando você pra escrever desse jeito, Leo?

    Tô sem palavras...

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